Saiba quais foram as alterações na Lei das Sociedades por Ações
Mudanças trazem importantes inovações para as companhias brasileiras, sejam elas abertas ou fechadas
Assuntos
Nos últimos três anos, diversas modificações foram feitas na Lei nº 6.404/76 (Lei das Sociedades por Ações), alterando pontos importantes da estrutura de governança e obrigações aplicáveis a esse tipo de sociedade, resumidas abaixo.
Novas regras para publicações
A partir de 1º de janeiro de 2022, a regra geral para companhias (abertas e fechadas) passará a ser a publicação somente em jornal de grande circulação e de forma resumida dos documentos e avisos exigidos por lei, inclusive demonstrações financeiras. Não será, portanto, mais necessária a publicação também em Diário Oficial. A íntegra dos documentos publicados de forma resumida deverá ser disponibilizada simultaneamente na página do respectivo jornal na internet, que deverá providenciar certificação digital da sua autenticidade emitida por autoridade certificadora credenciada no âmbito da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil).
No caso das demonstrações financeiras, a publicação resumida deverá conter, no mínimo, em comparação com os dados do exercício social anterior, informações ou valores globais relativos a cada grupo e a respectiva classificação de contas ou registros, bem como extratos das informações relevantes contidas nas notas explicativas, e nos pareceres dos auditores independentes e do conselho fiscal, se houver.
Para companhias abertas, o Parecer de Orientação nº 39 publicado pela Comissão de Valores Imobiliários (CVM) orienta que as demonstrações financeiras resumidas devem sempre ser elaboradas a partir dos números auditados das demonstrações financeiras completas, as quais devem estar simultaneamente divulgadas em endereço eletrônico indicado na publicação resumida. Esse parecer de orientação também orienta que as notas explicativas resumidas devam conter, no mínimo, as seguintes informações:
- Breve contexto operacional da companhia;
- Bases de elaboração e apresentação das demonstrações financeiras;
- Mudanças de práticas contábeis em relação ao exercício social anterior;
- Políticas contábeis críticas e as discricionárias; Eventos subsequentes relevantes.
Por fim, o parecer de orientação instrui que as demonstrações financeiras resumidas sejam precedidas de aviso que deixe explícito se tratar de demonstrações financeiras resumidas e que não devem ser consideradas isoladamente para tomada de decisões e indicação dos endereços eletrônicos nos quais será possível localizar as demonstrações financeiras completas, incluindo o relatório do auditor independente.
Assembleias Gerais e administração
Companhias passam a poder contar com somente um diretor (antes era exigido um mínimo de dois diretores). Também não é mais exigido que os diretores sejam residentes no Brasil, desde que, nesse caso, nomeiem um representante residente no Brasil para receber citações em ações propostas com base na legislação societária, bem como, conforme aplicável, para receber citações e intimações em processos instaurados pela CVM. Essa nomeação deve ser feita mediante procuração com validade de, no mínimo, três anos após o término do respectivo mandato.
A vedação à cumulação de cargos de presidente do conselho de administração e de diretor presidente ou principal executivo (antes restrita a companhias listadas em alguns dos segmentos da bolsa brasileira) passou a ser aplicável a todas as companhias abertas, podendo a CVM excepcionar tal vedação para sociedades de menor porte. Ainda, caberá à CVM estabelecer prazos e regras de participação obrigatória de conselheiros independentes nos conselhos de administração de companhias abertas.
Para companhias abertas, a primeira convocação de suas assembleias gerais deve ser feita, com no mínimo, 21 dias de antecedência (anteriormente, a antecedência mínima era de 15 dias). Além disso, também passaram a ser competência da sua assembleia geral a aprovação de operações com partes relacionadas e a alienação ou a contribuição de ativos para outra empresa, em cada caso se o valor da operação corresponda a mais de 50% do valor dos ativos totais da companhia constantes do último balanço aprovado.
A CVM passou a poder determinar, de forma fundamentada, o adiamento de assembleia geral de companhias abertas por até 30 dias caso constate insuficiência de informações necessárias para as respectivas deliberações, sendo tal prazo contado da data em que as informações consideradas completas e suficientes forem colocadas à disposição dos acionistas.
Votação e participação remota em assembleias gerais
Diversas alterações buscaram aumentar a possibilidade de participação dos acionistas nas assembleias gerais.
Os boletins de voto a distância, instrumentos semelhantes a cédulas de votação que podem ser enviadas pelos acionistas antes das assembleias gerais indicando seus votos nos itens da respectiva ordem do dia, passaram a ser admitidos tanto em companhias abertas quanto em fechadas, nos termos da regulamentação da CVM e do Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (Drei), respectivamente.
No mesmo sentido de tentar facilitar a participação de acionistas nas deliberações societárias, passou a ser admitida a realização de assembleias gerais em formato exclusivamente digital, tanto em companhias fechadas quanto em abertas, admitidas também assembleias gerais híbridas, com possibilidade de participação e votação presencial ou remota.
Livros societários mecanizados ou eletrônicos
Companhias (abertas e fechadas) podem optar por utilizar versões mecanizadas ou eletrônicas dos livros societários obrigatórios.
Para companhias fechadas, nos termos da Instrução Normativa nº 82 do Drei, a partir de 22 de junho de 2021, todo e qualquer livro decorrente de instrumentos de natureza societária, de escrituração contábil e dos agentes auxiliares do comércio poderá ser escriturado de forma totalmente eletrônica, sendo sua respectiva autenticação realizada de forma 100% eletrônica pela junta comercial competente. Nesse caso, os livros societários eletrônicos poderão ser assinados com uso de certificado digital emitido por entidade credenciada pela ICP-Brasil ou por qualquer outro meio que comprove a autoria e garanta a integridade de documentos assinados. A junta comercial competente ficará somente responsável pela autenticação dos termos de abertura e encerramento dos livros societários.
Já para companhias abertas, nos termos do artigo 31-A da Instrução CVM nº 480/09, os seguintes livros podem ser substituídos por registros mecanizados ou eletrônicos, desde que sejam armazenados com segurança e possam ser impressos em papel de forma legível e a qualquer momento: livro de registro de ações nominativas, livro de transferência de ações nominativas, livro de atas das assembleias gerais e livro de presença de acionistas.
Companhias de menor porte
Companhia fechadas com receita bruta anual de até R$ 78 milhões podem agora realizar as publicações ordenadas por lei de forma exclusivamente eletrônica, na Central de Balanços do Sistema Público de Escrituração Digital (Sped) e no site da sociedade. Tais companhias também podem utilizar versões mecanizadas ou eletrônicas dos livros societários obrigatórios. Na omissão do estatuto social quanto à distribuição de dividendos, os acionistas podem decidir livremente tal matéria, sem observância das regras de dividendo obrigatório, limitados somente pelo direito de acionistas preferencialistas de receber os dividendos fixos ou mínimos a que tenham prioridade.
A CVM passa a ser incumbida de regulamentar a classificação de companhias como de menor porte, bem como as condições para facilitar o acesso delas ao mercado de capitais, dispensando ou modulando a sua observância quanto à obrigatoriedade de instalação do conselho fiscal a pedido de acionistas, à obrigatoriedade de intermediação de instituição financeira em distribuições públicas de valores mobiliários, ao recebimento do dividendo obrigatório e à forma de realização de publicações ordenadas por lei.
Voto plural
O voto plural consiste na atribuição de dois ou mais votos a cada ação de uma classe, limitado a dez votos por ação.
Mecanismo antes proibido pela lei das sociedades por ações, o voto plural passou a ser admitido em companhias fechadas. Em companhias abertas, é possível manter ações de classe com voto plural, desde que instituído em momento anterior à sua abertura de capital, obedecidas as regras a serem editadas pelas bolsas de valores sobre o tema, e proibida a alteração das características de classe de ações ordinárias com atribuição de voto plural que não seja para reduzir os respectivos direitos ou vantagens.
A criação de classe de ação com voto plural depende da aprovação do voto favorável de, no mínimo, metade do total de votos conferidos pelas ações com direito a voto e, se houver, metade, no mínimo, das ações preferenciais sem direito a voto ou com voto restrito. Os acionistas dissidentes têm direito de retirada caso aprovada a criação de classe de ação com voto plural, salvo se o estatuto social já previr ou autorizar tal criação.
O prazo máximo de duração do voto plural é de sete anos, podendo ser prorrogado por qualquer prazo, desde que obtidas as mesmas aprovações exigidas quando da criação de classe de ações com voto plural, impedidos os titulares de tais ações de votar em tais aprovações e assegurado o direito de retirada aos dissidentes. O término do voto plural também pode estar condicionado a evento futuro.
Ações com voto plural são automaticamente convertidas em ações ordinárias sem voto plural em algumas situações. A primeira hipótese é a transferência de ações com voto plural a terceiros, exceto se forem transferidas a entidade que assegure ao alienante a titularidade exclusiva de tais ações e dos direitos políticos por elas conferidos (como transferência de ações com voto plural para sociedade holding cujo capital seja totalmente detido pelo alienante), o adquirente já seja titular da mesma classe de ações com voto plural a ele alienadas ou tratar-se de transferência em regime de titularidade fiduciária para fins de constituição do depósito centralizado. A segunda hipótese conversão automática é a celebração de acordo para dispor sobre exercício conjunto do direito de voto entre titulares de ações com voto plural e acionistas que não sejam titulares de ações com voto plural.
O voto plural é desconsiderado em deliberações sobre remuneração de administradores e celebração de operações com partes relacionadas consideradas relevantes, conforme definição a ser estabelecida pela CVM. Nesses casos, prevalece a regra geral que cada ação ordinária tem direito a um voto.
Por fim, companhias abertas com valores mobiliários admitidos à negociação e que não adotem voto plural não podem ser parte de reorganizações societárias cuja(s) entidade(s) resultantes seja(m) companhia(s) que adote(m) voto plural.
Para mais informações sobre o tema, conheça a prática de Societário/M&A do Mattos Filho.